Lobby por bets no governo mobiliza mais de 70 reuniões em nove ministérios

O debate no governo Lula (PT) sobre a regulamentação de jogos e apostas online, setor que inclui as chamadas bets, envolveu ao menos 78 reuniões em nove ministérios. A lei que regulamenta as aposta foi sancionada em 30 de dezembro pelo presidente, após meses de lobby de empresas, escritórios de advocacia e autoridades do governo em discussões nos ministérios e Congresso.

Os dados são do Agenda Transparente, ferramenta da Fiquem Sabendo —organização sem fins lucrativos especializada em transparência pública— usada para monitorar lobby no governo federal.

O mercado das bets domina patrocínios de times profissionais de futebol, atrai principalmente os mais jovens e levanta discussões sobre vício e prejuízos financeiros das apostas.

As reuniões foram feitas principalmente no Ministério da Fazenda, com 67 agendas.

Destes encontros, ao menos 53 envolveram o advogado José Francisco Manssur, ex-assessor da Fazenda que era cotado para assumir a nova Secretaria de Prêmio e Apostas, mas foi demitido em fevereiro. Ele chegou a se reunir com dois escritórios em que atuou no passado, o Ambiel e o Pinheiro Neto. Procurado, o ex-assessor da pasta não se manifestou.

Manssur deixou o governo sob pressão do centrão e do Ministério do Esportes para transferir para a pasta comandada por Fufuca (PP-MA) parte do controle sobre as casas de aposta.

As reuniões no Esporte sobre bets, porém, ainda são tímidas. Há apenas registros de três encontros feitos no ministério desde o começo de 2023, segundo as agendas públicas da pasta.

O governo também promete divulgar uma série de portarias para regulamentar o setor, mas a Secretaria de Apostas, criada no fim de janeiro, segue sem titular.

Em nota, o ministério de Fufuca diz que a Secretaria-Executiva, área que trata dos jogos, apostas e sorteios, está “passando por um processo de mudança de comando”. Isso porque o advogado e economista Paulo Vogel deixou a secretaria na última semana.

“Então, esses assuntos só poderão ser tratados a partir do momento que o novo secretário e sua equipe técnica assumirem a pasta”, diz o Esporte.

Do total de agendas do governo Lula, 57 foram realizadas em 2023 e outras 21 ocorreram no ano seguinte. Os dados da Fiquem Sabendo mostram encontros feitos até 12 de março.

Integrantes do setor das apostas dizem que também foram recebidos por técnicos de escalões mais baixos dos ministérios. Em alguns destes casos, não há exigência legal de divulgar estes compromissos.

As agendas mostram três reuniões de ministros sobre as apostas. Haddad se reuniu em março de 2023 com representantes de diversas empresas. O prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva, acompanhou o encontro.

Já Simone Tebet (Planejamento) e Luiz Marinho (Trabalho e Previdência) receberam o senador Eduardo Girão (Novo-CE), que faz oposição aos jogos de azar.

O Ministério da Saúde também promoveu ao menos uma reunião com ponderações sobre as apostas. Em setembro de 2023, a pasta discutiu com representantes da Fazenda “apostas esportivas/transtorno do jogo patológico”, segundo registro oficial da reunião.

As agendas citam mais de 50 pessoas jurídicas envolvidas no lobby das apostas, como empresas de apostas, plataformas de tecnologia, fintechs e escritórios de advogacia. Representantes da BET365 são os que mais aparecem nos encontros.

Já Google, Youtube, Meta (empresa que controla Facebook, WhatsApp e Instagram), Tik Tok e Kwai foram à Fazenda, em reuniões separadas, para tratar do “cumprimento de regras de publicidade das apostas de quotas fixas”.

Em fevereiro deste ano, Lula criticou os jogos online de apostas e os comparou a cassinos e ao jogo do bicho, embora ele mesmo tenha sancionado a lei que regulamenta o setor. “Isso porque cassino é proibido aqui. Porque cassino é jogo do azar, jogo do bicho é jogo de não sei das quantas. Mas no jogo eletrônico, agora pode jogar criança de 5 anos de idade à pessoa de 90 anos. Não tem limite. A ordem é jogar”, declarou Lula.

Além das reuniões na Fazenda e Esportes, as agendas mostram debates no ministérios do Trabalho, Justiça, Planejamento, Gestão, Saúde, além de CGU (Controladoria-Geral da União) e Casa Civil. Há ainda uma agenda nos Correios.

A Fazenda tem priorizado reuniões com duas associações, a ANJL (Associação Nacional de Jogos e Loterias) e o IBJR (Instituto Brasileiro de Jogo Responsável).

Em nota, o ministério comandado por Fernando Haddad (PT) afirma que “tem promovido um amplo diálogo” sobre a regulamentação de apostas de quota fixa e diz que não recebe apenas as associações. “Todas as solicitações de reunião encaminhadas à Secretaria de Prêmios e Apostas são atendidas e estão divulgadas.”

A Fazenda também diz que publicará uma agenda regulatória sobre as apostas, “contendo a relação das principais portarias que regulamentarão a matéria”.

“Como o processo de autorização das empresas, os meios de pagamento, os requisitos técnicos dos sistemas de apostas, medidas de jogo responsável, dentre outros importantes pontos da legislação vigente, a fim de que seja estabelecido um sistema regulatório equilibrado, seguro e eficaz”, afirma a Fazenda.

Fonte: Folha de São Paulo

Últimas Notícias

Relacionados