De olho nas ‘bets’, bancos estaduais planejam explorar loterias

Pelo menos três bancos estaduais no Brasil planejam começar a explorar loterias em meio à explosão do mercado de apostas no país com as “bets”. BRB (Distrito Federal), Banestes (Espírito Santo) e Banese (Sergipe) estão em processo de criar subsidiárias específicas para atuar na área, revela reportagem do Valor.

Com o crescimento dos sites de apostas esportivas e o domínio da Caixa nas loterias, as instituições financeiras estaduais contam com o apelo regional e a capilaridade que têm para conquistar clientes. Dos cinco bancos estaduais existentes, somente o Banrisul (Rio Grande do Sul) e Banpará (Pará) não têm projetos nesse sentido.

Os planos vêm de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou em 2020 que a União não tinha o monopólio na explorações de loterias e pacificou uma discussão antiga com alguns Estados. Desde então, governos estaduais vêm se preparando para explorar o serviço e, alguns dos que ainda têm bancos, estão colocando a loteria debaixo dessas instituições.

O mercado é grande. A Caixa teve arrecadação recorde com as loterias no ano passado, de R$ 25,6 bilhões. Também em 2024, a subsidiária Caixa Loterias se tornou operacional e concentrou as atividades de jogos, retomando inclusive a “raspadinha”, que havia sido interrompida há quase nove anos.

No Distrito Federal, em 2023 o BRB chegou a anunciar um acordo com a portuguesa SCML para a exploração das loterias, mas o negócio não foi assinado por causa de questionamentos sobre a legalidade do certame. Agora, o processo de escolha de uma parceiro foi retomado, com a contratação do BTG Pactual para analisar as possibilidades. A expectativa é finalizá-lo ainda neste semestre. Segundo Diogo Oliveira, diretor de atacado e governo do BRB, a projeção é arrecadar quase R$ 100 milhões por ano com a exploração da loteria.

“A lei não permite cassino de pano [físico], jogo do bicho e bingo, o resto em tese pode”, Ricardo Pessanha.

“O banco tem capilaridade e tem a força da marca, as pessoas sabem que somos controlados por uma série de regulamentações, a obrigatoriedade de questões de segurança, então tem uma questão de credibilidade”, diz.

O BRB tem um banco digital em parceria com o Flamengo, mas pela lei só poderá vender loterias no Distrito Federal. “Com geolocalização, conseguimos saber se o cliente está dentro das fronteiras do DF e oferecer ou não esse serviço.”

Já no Espírito Santo, a Genial está conduzindo o processo para a escolha de um parceiro para o Banestes, que deve ser finalizado até março. O banco não divulga a expectativa de arrecadação com loterias. “Lógico que existe uma curva de crescimento nos primeiros dois, três anos, mas a expectativa é que seja uma fonte de receita significativa”, diz Silvio Grillo, diretor de relações com investidores e finanças.

Segundo o presidente da Banestes Loteria, Ricardo Pessanha, a ideia é distribuir o produto por meio da rede de correspondentes do banco, chamada BanesFácil, que conta com quase 400 pontos, além de canais digitais. “Acredito que há um ‘cross-sell’ [venda cruzada] elevado colocando as loterias nesse canal de correspondentes bancários. Eles podem deixar de ter um caráter basicamente transacional para ser também um ponto relacional”, afirma.

O Banestes vai operar uma bet e não descarta a possibilidade de ter máquinas físicas de videoloteria, trazendo para o mundo real modalidades que funcionam como o “jogo do tigrinho” dos celulares. “A lei não permite cassino de pano [físico], jogo do bicho e bingo, o resto em tese pode. Hoje uma enorme parte das bets e ‘tigrinho’ opera de maneira clandestina, e queremos trazer para a luz o que antes era feito em ambientes escondidos. Claro que vai depender do parceiro que vamos escolher, mas o que for dentro da legalidade vamos estudar”, diz Pessanha.

Em Sergipe, o Banese escolheu um consórcio formado por Culloden/TSA para ter uma participação minoritária na subsidiária que vai explorar a loteria. Ela foi criada no mês passado e a expectativa é que os produtos sejam lançados ainda no primeiro semestre. “A operação de loterias demanda canais de distribuição robustos, soluções de pagamento eficientes [como wallets, adquirência, Pix, ‘cash-in’ e ‘cash-out’] e uma base de clientes diversificada. O Banese, por meio de seu conglomerado, detém a maior capilaridade de atendimento em Sergipe, além de oferecer todas as soluções financeiras necessárias para suportar uma operação de loterias”, diz o banco em resposta enviada ao Valor.

Segundo o Banese, estudos estimaram que o mercado de loterias em Sergipe era de cerca de R$ 120 milhões em 2019, ainda sem o aumento recente das bets. “A nova subsidiária do Banese tem como meta se consolidar como líder do setor de loterias em Sergipe dentro dos primeiros cinco anos de operação. O objetivo é alcançar 50% de market share do mercado lotérico no Estado durante esse período.”

A CEO da unidade de loterias da Caixa, Luciola Aor Vasconcelos, diz não temer a competição com loterias estaduais. “Para a gente é bem tranquilo, operamos em todo o território nacional. Mas não significa que não estejamos olhando o mercado concorrencial.”

A executiva também afirma que, apesar de haver uma diversidade de jogos – prognóstico numérico (loteria tradicional), instantâneo (raspadinha) e cota fixa (como as bets) -, as modalidades não competem entre si. “Um canibaliza o outro um pouquinho, mas é pouco, eles não são concorrentes entre si. O mundo das bets está posto, mas não afeta nossa atuação.”

Os bancos dizem ter preocupação com a educação financeira para evitar o endividamento dos apostadores e afirmam que terão medidas para combater o vício em jogos. É o caso inclusive da Caixa, que também vai operar uma bet. “A gente vende divertimento, sonhos, mas temos uma preocupação muito grande com a questão social. No mercado de bets teremos uma preocupação ainda maior com esses aspectos”, diz Vasconcelos.

Diferentemente dos bancos estaduais, que devem ter parceiros para operar suas loterias e bets, a Caixa pretende atuar de maneira independente.

Fonte: Valor Econômico

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