Mesmo após sanção da Lei das Bets, comércio de itens virtuais continua fora do radar da fiscalização e pode ameaçar integridade do setor
A regulamentação das apostas de quota fixa no Brasil, consolidada com a Lei nº 14.790/2023, foi um marco aguardado no setor. No entanto, uma lacuna significativa permanece: a ausência de controle sobre apostas envolvendo skins, loot boxes e itens virtuais utilizados como moedas de troca em jogos online.
Apesar do avanço regulatório, plataformas — muitas operando sem licença — seguem permitindo a utilização desses ativos digitais em apostas e sorteios paralelos, criando um mercado cinza que escapa ao alcance das autoridades brasileiras.
Especialista alerta: “É um mercado paralelo fora do radar”
Segundo Filipe Senna, sócio do Jantalia Advogados e secretário-geral da Comissão de Direito de Jogos da OAB-DF, a utilização de itens virtuais em apostas configura um risco sério à integridade do ambiente digital.
“A utilização de skins e itens de jogos como moeda de aposta cria um mercado paralelo que escapa ao controle das autoridades. Isso compromete a integridade do setor e expõe, principalmente os mais jovens, a práticas potencialmente nocivas”, afirma o especialista, que também é mestre em Regulação de Jogos e Apostas pelo IDP/DF.
Apostas com loot boxes: um problema crescente no Brasil
Loot boxes, gatchapons e sistemas de recompensas aleatórias se tornaram comuns em jogos mobile e de console, especialmente voltados ao público infantojuvenil. A lógica é semelhante à dos cassinos: o jogador paga por uma chance aleatória de obter um item raro ou valioso.
Esses sistemas, sem qualquer tipo de auditoria pública ou controle técnico sobre o RNG (Random Number Generator), geram preocupação entre especialistas.
“É preocupante ver crianças expostas a sistemas baseados em sorte, que operam sem qualquer auditoria técnica ou controle público”, reforça Senna. “Isso favorece a exploração emocional e financeira dos menores.”

Falta de controle de idade e anonimato agravam riscos
Outro ponto de atenção é a facilidade de acesso a essas plataformas. Em muitos casos, não há qualquer controle etário ou barreira à entrada, o que aumenta os riscos de dependência, manipulação emocional e até fraudes.
A combinação entre apostas, anonimato e prêmios com valor monetário indireto cria um ambiente perigoso, principalmente para públicos mais vulneráveis.
Cenário internacional já avança, Brasil ainda está no início da discussão
Enquanto Austrália, Dinamarca e Reino Unido já desenvolveram regulamentações específicas para essas práticas, o Brasil ainda engatinha nesse debate. O próprio Ministério da Fazenda e o Ministério do Esporte já reconheceram que loot boxes e skins não estão contemplados na legislação atual, o que deixa essas atividades em uma zona cinzenta jurídica.
Regulamentação urgente: o que propõe Filipe Senna
Para Senna, é fundamental que o Poder Público reconheça essas práticas como formas de jogo de sorte e estabeleça diretrizes claras de operação.
“Não podemos permitir que a monetização aleatória em jogos eletrônicos siga operando à margem da regulação, sobretudo quando se direciona ao público mais vulnerável. São formas modernas de apostas disfarçadas de entretenimento.”
Conclusão: a urgência de um marco regulatório para itens virtuais
A evolução do mercado exige que o Brasil avance na construção de um marco regulatório específico para apostas com itens virtuais. A colaboração entre entes públicos, setor privado e sociedade civil será essencial para garantir um ambiente mais transparente, seguro e fiscalizado.
Fonte:
Filipe Senna – Sócio do Jantalia Advogados, Mestre em Direito de Jogos com enfoque em Jogos Online pelo IDP/DF, autor de A Regulação da Sorte na Internet.